Resumo
Em muitos países o desemprego atinge valores preocupantes; contudo, essa quantificação ajustada à população portadora de limitações físicas e/ou mentais, é ainda mais elevada. Alguns estudos estimam que cerca de 10% da população mundial detém algum tipo de incapacidade. Contudo, devido à evolução médica, a longevidade destes indivíduos é cada vez maior, pelo que se torna mais importante fornecer um serviço de orientação / reabilitação / formação profissional.
A equipa de Saúde Ocupacional poderia fomentar uma discriminação positiva, capaz de proporcionar formação adequada a estes indivíduos e divulgar junto das entidades empregadoras quais as tarefas/postos que poderiam ser executados ou adaptados a esta população e respetivas vantagens económicas, técnicas e sociais.
Descritores
Pessoas com deficiência, saúde do trabalhador, medicina do trabalho, deficiências do desenvolvimento, transtornos de aprendizagem.
Introdução e Objetivos
Face às atuais condições económicas, em muitos países o desemprego da população geral atinge valores preocupantes; contudo, essa quantificação ajustada à subpopulação portadora de alguma limitação física e/ou mental, adquire valores ainda mais elevados. As equipas de Saúde Ocupacional poderiam fomentar uma discriminação positiva, através da orientação/reabilitação profissional, capaz de proporcionar formação adequada a estes indivíduos e divulgar junto das entidades empregadoras quais as tarefas/postos que poderiam ser executados ou adaptados; destacando ainda as respetivas vantagens económicas, técnicas e sociais. Contudo, a bibliografia existente sobre o tema é muito escassa e/ou vaga. Pretendeu-se assim com esta revisão bibliográfica resumir o que de mais recente e pertinente se publicou sobre o tema de forma a fornecer aos profissionais das equipas de Saúde Ocupacional alguns conhecimentos para atuar nesta área.
Metodologia
Foi realizada uma pesquisa em abril de 2012, nas bases de dados “CINALH plus with full text, Medline with full text, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Cochrane Methodology Register, Nursing and Allied Health Collection: comprehensive, MedicLatina e Academic Search Complete”. Utilizando a palavra-chave “disabilities” conjugada com as expressões-chave “occupational medicine” e “occupational health”, foram obtidos 307 e 55 artigos respetivamente, utilizando os critérios publicação igual ou superior a 2002, acesso a texto completo e línguas portuguesa, inglesa ou espanhola. Após uma primeira leitura dos trabalhos obtidos, os autores perceberam que existiam fatores de risco abordados de forma muito superficial, pelo que foram realizadas em acréscimo sub-pesquisas mais direcionadas, utilizando a conjugação das palavras e expressões-chave indicadas no quadro 1, mantendo-se os mesmos critérios de seleção dos artigos. Em função da qualidade metodológica e da pertinência para o objetivo da revisão, foram selecionados 52 artigos. Os autores realçam que esta revisão bibliográfica é narrativa, ou seja, todos os artigos que cumprissem os critérios atrás mencionados foram incluídos, independentemente do tipo de estudo e respetiva força estatística (até porque não foram encontrados trabalhos suficientemente robustos que permitissem elaborar uma revisão bibliográfica sistemática).
Uma vez que não se encontrou qualquer artigo relacionado com a legislação portuguesa, foi consultado o site do Centro de Emprego e retiradas dele as informações mais pertinentes ao objetivo deste trabalho.
Resultados da Revisão Bibliográfica
Algumas noções gerais
Alguns estudos estimam que cerca de 10% da população mundial detém algum tipo de incapacidade1. No entanto, devido à evolução médica, a longevidade destes pacientes é cada vez maior, pelo que se torna mais importante fornecer um serviço de orientação/reabilitação/formação profissional2-9. As limitações podem ser físicas, cognitivas, sensoriais ou verbais; temporárias ou permanentes; congénitas ou adquiridas; associadas ao trabalho ou não; estáveis ou progressivas10. Geralmente nas alturas de crescimento económico, estes indivíduos são os últimos a serem contratados e, em alturas de recessão, os primeiros a serem dispensados; apesar de, teoricamente, os gestores concordarem com a legislação que incentiva à discriminação positiva e pune a discriminação negativa11; aliás, um estudo quantificou que cerca de 74% dos gestores acreditava que estes trabalhadores (mesmo com limitações severas) poderiam ter desempenhos equivalentes à da população geral, sobretudo devido à sua maior dedicação e empenho12,13.
Na generalidade dos estudos consultados a taxa de desemprego nestes indivíduos é muito superior à da população em geral, por vezes quase duplicada2,14. Ainda assim, estas quantificações variam muito com as definições de trabalho (alguns incluem postos não remunerados, estudantes e/ou voluntariado)2. Na Grécia, por exemplo, estimava-se que cerca de 18,2% da população é portadora de alguma incapacidade, sendo que, destes, 84% não tem qualquer atividade profissional remunerada; dos restantes, a maioria estava empregada poucas horas e/ou por um valor/ hora inferior ao da população em geral11. Estima-se que nos EUA, por sua vez, existissem cerca de 12 milhões de indivíduos com alguma limitação física2.
“(…) cerca de 10% da população mundial detém algum tipo de incapacidade1. No entanto, devido à evolução médica, a longevidade destes pacientes é cada vez maior, pelo que se torna mais importante fornecer um serviço de orientação/reabilitação/formação profissional2-9.”
Por vezes os empregadores demonstram-se reticentes em contratar indivíduos com deficiências; contudo, uma vez que o façam, após adquirir alguma experiência, ficam mais predispostos a contratar pessoas com incapacidades equivalentes11,12,15. Quanto ao tamanho da empresa, as instituições de maior dimensão (pela variabilidade de postos e mais recursos) têm mais facilidade em dar este passo; contudo, tal não é consensual. Muitas vezes não é necessário qualquer adaptação do posto de trabalho, ainda assim, na generalidade dos casos, quando ocorrem, não costumam ser dispendiosos12 (estimasse que apenas num quinto dos casos existem custos e, destes, 71% das empresas têm capacidade para os pagar, eventualmente)10. Quando as entidades empregadoras não procedem às adaptações adequadas no posto de trabalho, surgem consequências negativas para todos: a empresa não obtém lucro/produtividade esperados e piora a sua imagem social e segurança, sendo que os trabalhadores com deficiências voltarão a ter de procurar outro emprego, eventualmente realizar nova reabilitação/formação profissional, com implicações financeiras e ao nível da auto estima. Ainda assim, torna-se complicado definir que tipo de incapacidade pode se adaptar a determinado posto de trabalho, uma vez que cada funcionário reúne personalidade, talentos e experiências profissionais prévias diferentes1. Contudo, ter acesso a um emprego significa ter a possibilidade de se realizar profissionalmente, de se inserir na sociedade, aumentar a autoestima e adquirir independência económica2,5,6,8,17; bem como acesso a melhores cuidados gerais de saúde5,7,18,19.
Alguns empregadores analisam apenas a parte técnica e não valorizam a integração social do funcionário com limitações, pelo que o trabalho em equipa ficará prejudicado12. A aceitação e apoio dos outros funcionários são fundamentais, pelo que estes últimos devem receber formação sobre as limitações dos futuros colegas1; tal promove o bem-estar, a autoestima e a noção de controlo, que atuam como tampão para os efeitos do stresse16.
Para alguns indivíduos, dada a falta de oportunidades laborais, a solução poderá passar pela criação do seu próprio posto de trabalho; as características mais favorecedoras deste passo são um nível educacional/académico mais elevado, gosto por desafios e vontade de provar competências17. Outros optam por exercer no domicílio; assim, eliminam os problemas da acessibilidade/mobilidade; contudo, alguns autores também mencionam que os custos de adaptar o domicílio, a falta de supervisão/formação contínua e o isolamento profissional social, bem como as dificuldades de progressão na carreira, podem ser penalizadoras5,20. Genericamente, um melhor nível educacional implicará uma escolha mais alargada de postos de trabalho com melhores condições (benefícios gerais, salários) e maior capacidade para negociar (horários, remuneração)2.
Contudo, quase todos os artigos encontrados retratam os países mais desenvolvidos; praticamente não se encontram registos das zonas mais desfavorecidas. Alguns autores supõem que a maioria destes indivíduos, nestes países, fique em casa, sem qualquer atividade profissional remunerada; aliás, em algumas culturas chegam a ser escondidos da comunidade, pela vergonha que determinadas deficiências acarretam5.