A eleição de Donald Trump para Presidente dos Estados Unidos da América terá sido uma surpresa para muitos de nós, fundamentalmente enganados pelas sondagens, pelas nossas crenças que algo tão desesperadamente mau não aconteceria e que, no fundo da América profunda, reinaria um pouco de bom senso que impediria tal catástrofe.
Tal não aconteceu e, agora, só temos de esperar para ver o resultado prático de mais uma demonstração da democracia representativa a funcionar (sim, porque não é pelo facto da escolha não ter agradado que vamos começar a inventar que “aquilo” não é a democracia representativa a funcionar, como já houve alguém que o disse). Não nos parece que valha a pena vaticinar eventos positivos ou negativos dada a personalidade aparentemente instável de Donald Trump, deixamos isso para os comentadores e analistas políticos, ainda que, acreditando nas palavras proferidas durante a campanha, não nos pareça que algo de bom resulte durante a sua presidência.
E, pela novidade, e contra a intelligentsia reinante, temos de acreditar que uma das diferenças para o voto naquele individuo é o de existir a esperança que cumpra o que prometeu durante a campanha.
Na realidade, um dos problemas com que nos deparamos com o que já é designado de política tradicional é o discurso efectuado no momento das campanhas eleitorais e o discurso praticado no dia seguinte à chegada ao poder.
Parte da insatisfação de muitos de nós deriva de nos sentirmos enganados permanentemente, não encontrarmos quem traduza de facto os nossos desejos e expectativas, e já darmos por adquirido que tal decepção vai ocorrer; então resolvemos não participar (não votando), ou participamos votando em branco (manifestação irrelevante do nosso descontentamento, não com A, nem com B, mas com todo o sistema) ou, eventualmente, a pior situação, porque suporta e alimenta a sobrevivência do sistema, votamos em quem sabemos que nos vai decepcionar, à semelhança dos outros participantes, mas será um voto “do mal, o menos”.
Quando aparecem novos actores no sistema tendemos a, teimosamente, acreditar que “estes” é que não nos vão enganar e sentimos empatia pelos seus discursos revoltados e “próximos” de nós, vozes que aparentemente ecoam as nossas, ganhando assim o nosso voto, como podemos ver nos movimentos inorgânicos que vão surgindo por toda a Europa bem como com o voto de protesto atribuído a partidos de natureza extremista.
Durante muitos anos, em Portugal, sempre que existiam discursos contra a classe política em geral, apareciam logo um ou dois políticos a dizerem que eram uns incompreendidos, que a classe política não merecia tal tratamento e que eles, coitados, eram uns sacrificados na sua missão de tentar melhorar as condições de vida do povo. Infelizmente ainda é um discurso recorrente.