A segurança contra atos antissociais é um bem intangível – uma condição imaginada de ausência de perigo e de preocupação relativamente a um valor, em resultado das medidas tomadas para evitar e minimizar o dano intencionalmente causado a esse valor.
Como o risco de ato antissocial se concretizar aumenta com a atratividade do valor, com a motivação da ameaça e com a vulnerabilidade do alvo, então, para reduzir o referido risco, é necessário dissuadir a ameaça – reduzindo o valor e desmotivando a ameaça – e proteger o valor, designadamente diminuindo a vulnerabilidade do alvo.
Ainda que, nos últimos anos, o número global de atentados terroristas não tenha aumentado, a incidência destes em território europeu não para de crescer. Em particular, no corrente ano, têm-se sucedido atos antissociais de grande violência contra alvos europeus, como no caso do atropelamento deliberado de centenas de pessoas, com um camião, em Nice. Este caso foi bem exemplificativo de como é difícil resolver a favor da segurança pública, a inequação da segurança contra os atos antissociais:
Tempo(ameaça) > Tempo(deteção) + Tempo(reação)
Para que se consiga impedir um ato antissocial, é necessário que o tempo que a ameaça demora para danificar o valor – neste caso, as vidas humanas – seja maior que a soma dos tempos de deteção dessa ameaça e de reação capaz de a deter. Ora, no atentando de Nice, ficou claro como uma ameaça se pode concretizar antes de ser detetada e detida. Sem ser detetado pelas forças e serviços de segurança, o indivíduo que atropelou as vítimas, radicalizou-se em alguns meses, por exposição a conteúdos online e a contactos de origem terrorista. Depois, em alguns dias, armou-se com o que precisava, fez o reconhecimento do local a atacar, escolheu o momento em que havia mais valor vulnerável e só foi detetado após começar a passar com o camião por cima das vítimas. Apesar do (comparativamente) pouco tempo que as forças de segurança necessitaram para neutralizar a ameaça, ainda assim, o tempo que a ameaça levou a concretizar-se foi menor que a soma dos tempos da sua deteção e reação – pelo que o terrorista conseguiu matar e ferir tantas pessoas.
Portanto, neste, como nos demais atentados concretizados, a inequação da segurança contra os atos antissociais não se conseguiu resolver a favor da segurança pública. Mas foi assim com todas as ameaças. Embora tal facto não gere tantas notícias como os atentados, não têm sido concretizadas mais ameaças, porque foram detetadas e neutralizadas antes de se concretizar. Tal tem sido conseguido pelos serviços de inteligência, e por forças e serviços de segurança pública, com a colaboração de outros contribuintes para a segurança pública – como os serviços de segurança privada, de segurança de infraestruturas críticas e de empresas transportadoras, entre outros.
Para melhorar a fração destes casos de sucesso, os governos europeus apostam cada vez mais em medidas securitárias, com os objetivos de:
- Dissuadir a ameaça;
- Detetar a ameaça;
- Retardar a ameaça;
- Reagir à ameaça.
Independentemente da sua inevitabilidade, as medidas securitárias são condições necessárias, mas não suficientes para extinguir o terrorismo. O terrorismo tem causas profundas e difusas que são bem mais toleradas que os atos terroristas. Enquanto essas causas persistirem, não deixarão de gerar terrorismo.
Sem se pretender reduzir toda a complexidade do fenómeno multicausal do terrorismo e todas as soluções necessárias, pode-se atender ao que se aprendeu com a experiência de terrorismo da própria Europa. No final do século passado, ainda havia terrorismo residencial na Europa – como nos casos do IRA, baseado na Irlanda do Norte, e da ETA, baseado no norte de Espanha. Estas organizações só podiam subsistir com financiamento, alimento, ocultação e motivação – só possíveis com a tolerância da população e a cumplicidade de parte da comunidade. A Grã-Bretanha e a Espanha sempre reprimiram o terrorismo com medidas securitárias, mas aquele só se desvaneceu quando as comunidades se escolarizaram, prosperaram, deixaram de se rever nos métodos do terrorismo e passaram a expressar as suas insatisfações sem necessidade de recorrer à violência. Ou seja, aprendeu-se com a experiência do próprio terrorismo europeu que, quando as pessoas prosperam e as sociedades beneficiam, o terrorismo deixa de ser apoiado e tende a desaparecer.