Os últimos meses têm sido férteis em acontecimentos relacionados com a segurança internacional, especialmente focados na questão ucraniana.
Neste âmbito particular, continuamos a assistir a um duelo de sanções versus ações de natureza militar, conduzidas estas últimas, aparentemente, pela Rússia no interior da Ucrânia, sendo as primeiras ditadas pela União Europeia e pelos Estados Unidos (EUA).
Sobre a eficácia das últimas, parece que a situação no terreno terá evoluído para uma estabilização, ainda que precária, debaixo do “guarda-chuva” de um acordo de cessar-fogo, o qual, consta, nos primeiros dias ainda terá permitido vítimas civis.
Sem que pareçam existir dúvidas sobre a responsabilidade da Rússia pela geração dos incidentes que deram origem a uma quase (?) guerra civil ucraniana, será altura de olhar para a situação sob um ponto de vista estratégico, o que é dizer, de uma forma desapaixonada e realista.
William F. Owen é editor do Infinity Journal, uma publicação online, dedicada à estratégia e a temas conexos. No último editorial, Owen diz que todos os estrategas deviam ter um cão, brincando com a imaginação do que o cão diria se confrontado com uma situação de violência para atingir um fim estratégico, perspetivando a noção de que, atualmente, se confunde o que é estratégia e o que é política (no seu sentido mais lato). O cão acharia que o Presidente da Síria tem uma estratégia “menos má” quando recorre à violência para o manter no poder; pelo menos melhor do que a estratégia dos EUA e das Nações Unidas. Da mesma forma, julgaria que o Presidente Putin terá utilizado a violência e/ou a ameaça de força física para conseguir atingir e manter uma posição benéfica para o seu regime.
Owen continua dizendo que, “se um humano utilizasse a mesma argumentação, esta seria destruída por uma vaga de opinião pública, sob a máscara de ultraje moral. O cão, por sua vez, entenderia sumamente ridícula a sugestão de que os dois governantes citados nunca deveriam ter utilizado a força para atingir ou apoiar as suas políticas particulares”.
Termina, afirmando que “faz sentido ouvir os cães, pois eles entendem, não invocam opiniões políticas, não querem saber da política sob uma perspectiva supostamente ética; só lhes importa saber se a violência pode ser utilizada para atingir o estado desejado e de como é que a violência pode ajudar ou negar tal prossecução”.
O editorial, brincando, reafirma o princípio básico de que a estratégia serve os objectivos determinados pela política, conforme Clausewitz escreveu. Não é a estratégia que tem de ser ética; quanto muito será a política que deverá ser eticamente correta. Mas, no que respeita às relações internacionais e, em particular, à defesa dos interesses de um Estado perante os seus congéneres, é difícil (senão impossível) falar-se em ética.
Não precisamos de lembrar as desculpas dadas para a invasão do Iraque, para a cambalhota que a situação na Líbia obrigou várias Estados europeus a dar (situação que já não ocorreu, por exemplo, na Síria), para a inação ou, pelo menos, falta de determinação na África Central, já para não referir a demora da entrada em ação nos Balcãs (ou até para esclarecimento de questões de ordem humanitária que naquela zona ocorreram e ainda hoje permanecem pouco claras), o papel muito pouco ético desempenhado por vários Estados no caso de Timor, podendo prosseguir enquanto houvesse papel e história para analisar. É, portanto, difícil falar-se em ética e moral nas relações internacionais, restando apenas a justiça, a ética e a moral dos vencedores, quem quer que estes sejam; e isto não é sinónimo de que seja verdadeira justiça, ética ou moral.